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SACO CHEIO DE CAMPANHA ELEITORAL: O MANIFESTO

Fico pensando por que será
que vou votar em 5 de outubro
(crônica escrita em 2008)

Tenho que admitir: não agüento mais essa coisa de “campanha eleitoral”. E olha que é uma declaração comprometedora, pois pode ser que um dia eu resolva ser candidato a qualquer coisa – qual moral eu teria para fazer campanha, depois de tal afirmação? Mas não tem jeito, é a mais pura verdade. E não falo apenas da atual campanha, absolutamente insuportável, mas dessa instituição supostamente democrática, que a cada dois anos enche a nossa paciência.
Não sei se estou ficando velho ou cínico – provavelmente, as duas coisas – mas não vejo mais sentido nisso tudo. Comecei a me interessar por política ainda na adolescência, naquele fim de Ditadura Militar, e tudo o que a gente queria eram eleições – o símbolo máximo da democracia. O problema é que, agora caiu a ficha, com todo o processo eleitoral vem a campanha, com seus excessos, promessas vazias, xingamentos, jogos de marketing, abuso do poder econômico, uso da máquina administrativa e – pior de tudo – compra de votos.
Não acredito mais no sistema eleitoral como está, mesmo reconhecendo que as alternativas são piores (golpes, ditaduras, etc). Aparentemente, a humanidade não está nem um pouco interessada em encontrar uma alternativa viável para a representatividade política e o governo democrático, sem o show de aberrações que vem a público em cada campanha. No Brasil, a Justiça Eleitoral dá mostras de que está atuante, especialmente nesta eleição. Encolheu a campanha para três meses, tentou limitar formas de propaganda que favoreçam os mais poderosos, está até mesmo cassando candidatos com ficha suja. É uma luz no fim do túnel.
Mas o que se vê nas ruas ainda incomoda, e muito. O processo eleitoral já começa viciado, nas convenções partidárias e no fechamento das “coligações”. Só sai candidato quem pode – leia-se, quem está disposto a fazer o jogo sujo político – e não quem quer. Nas eleições legislativas a situação é ainda pior, já que existe o tal voto proporcional. Será que alguém vê lógica num sistema eleitoral em que os mais votados podem não ser eleitos, caso o seu partido não atinja a tão sonhada “legenda”?
Criticamos a eleição de Bush nos EUA, quando o mais votado foi Al Gore, mas aqui isso acontece sempre, com deputados e vereadores eleitos quando não foram os mais votados. Em minha cidade, por exemplo, nas eleições de 96 apenas um partido atingiu a legenda – resultado, elegeu todos os vereadores da Câmara Municipal. Com isso, até gente com 12 votos passou a representar os cidadãos, enquanto quatro entre os cinco mais votados ficaram de fora da Câmara. Absurdo.
A campanha eleitoral, em si, é apenas a cereja podre no bolo político, mas diz muito sobre o que é a nossa democracia. O poder econômico manda em quase todos os lugares – exceto aonde falam mais alto o narcotráfico e/ou as milícias. O curral eleitoral é uma instituição nacional, desde os tempos do império, talvez mais forte que o samba ou o futebol.
Não bastasse tudo isso, a maioria – senão, a quase totalidade – dos candidatos não se dá ao trabalho de pensar seriamente e elaborar suas propostas de governo ou de ação legislativa. Tem gente que se candidata sem ao menos saber as atribuições do cargo. São candidatos a vereador prometendo fazer obras ou aumentar a segurança, quando na sua pouca significância podem “apenas” legislar (no âmbito municipal, que fique claro) e fiscalizar as ações do Executivo. O resto é conversa para boi dormir, é o assistencialismo barato do “remédio” ou “tijolo” que compram o próximo voto. Por isso, há tantas promessas vazias na TV, no rádio, nos panfletos.
Numa outra realidade, isso poderia ser diferente: se o pretenso futuro candidato fosse obrigado a passar por um curso político a cargo da Justiça eleitoral, para obter o registro; se cada candidato tivesse que registrar seu “compromisso eleitoral” (ou seja, suas promessas) na Justiça eleitoral, sob pena de perder o mandato em caso de descumprimento; se a campanha eleitoral fosse silenciosa e respeitosa, sem os insuportáveis carros de som e “buzinaços” que cruzam a cidade; se o voto não fosse obrigatório ...
Fico abismado que, em pleno século 21, alguém ainda acredite que pode ganhar algum voto só porque seu número é cantado em ritmo de samba, forró, bolero ou sertanejo. Os carros de som servem mais como uma demonstração de força – se o candidato não tem, é porque “está quebrado”. Para complicar tudo, a campanha chegou com toda força à Internet onde a falta de regulamentação permite qualquer tipo de abuso – e-mails spam, mensagens no Orkut, blog, fotoblogs, vídeos no You Tube. Vale tudo para atrapalhar a nossa boa navegação – mas chego a arriscar que quem se utiliza desses instrumentos acaba perdendo, e não ganhando votos.
Bom, se a profecia dos antigos maias de que o mundo vai acabar em 2012 se cumprir, ou se o aquecimento global provocar o fim trágico do mundo como conhecemos, eu não vou precisar me preocupar com as questões eleitorais por muito tempo. Afinal, até essas previsões catastróficas parecem mais fáceis de acontecer do que o Brasil passar por uma verdadeira reforma política.


(Direitos reservados. Publicado no site do autor em 25/09/2008)

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