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GOIABAS NO PÉ E ALPARGATAS RODA NOS PÉS

Em 1962, eu morava com minha família (meus pais e minha irmã) na zona rural de Borborema (SP), numa casa de colonos de um sítio cujo quintal, na sua parte traseira, fazia divisa com uma mata densa que cercava e sombreava um córrego (corgo no dialeto caipira) que, naquela época, era conhecido como Lambari; era o que me diziam os mais velhos. O nome Lambari era uma referência bem real, por conta da presença abundante dessa espécie de peixe nas suas águas claras e frias.

O que eu mais gostava naquela mata ciliar do Lambari era das goiabeiras (goiabas vermelhas), havia muitas delas, muitas mesmo, ainda me lembro... Na maioria dos dias eu andava a cata das goiabas, subindo nos galhos e comendo-as ali mesmo, até me fartar. Era por demais de bom... A doçura delas era incomparavelmente superior a dessas goiabas enormes e cheias de veneno, encontradas nos varejões e supermercados da atualidade, acreditem! São as memórias guardadas nas minhas papilas gustativas.

Apanhar goiabas no mato era muito bom, mas não era possível fazê-lo com os pés descalços, pois o risco de se machucar era bem real. Os calçados mais usados pelas crianças da roça, naquela época, eram as alpargatas. Eram calçados populares feitos de lona e com sola de corda (sisal). Elas eram fabricadas nas cores azul, marrom e vermelho e faziam muito sucesso no meio rural paulista pela comodidade dos seus baixos preços.

Nos anos 60, as alpargatas eram muito usadas para trabalho na lavoura e no dia da vida no campo. Era praticamente impossível não encontrá-las nos armazéns e vendinhas rurais. Como um menino daquela época, eu tinha as minhas alpargatas e as usava até o limite da sua existência. Com o tempo o sisal do solado se esgarçava, ficando todo esfiapado e, para resolver isso, aparávamos os fios com uma tesoura; fazíamos a barba delas e elas ganhavam uma sobrevida.

Ir à mata coletar goiabas maduras calçando Alpargatas Roda fazia parte da minha rotina na maior parte dos dias, naquele ano de 1962, enquanto eu morei naquele sítio que, para mim, era um tipo de paraíso particular. Os meninos e meninas do meio rural da pequena Borborema viveram experiências semelhantes, com certeza...

Para as crianças, penso eu, olhando para a minha história, essas memórias das coisas simples, despretensiosas e inocentes sempre são dignas de serem resgatadas. Também acredito que, principalmente em tempos tão complexos, ambiciosos e maliciosos, como os que se mostram nos dias de hoje, tais resgates sejam até necessários. Tratam-se de memórias de tempos mais suaves para serem confrontados com os tempos mais ásperos e embrutecidos deste início do século XXI.

 
   
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