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VIDAS TROCADASVIDAS TROCADAS
Dandara e Daniella, duas irmãs criadas em uma pequena cidade do interior do Paraná, viviam com sua mãe viúva, em um sitio que pertencia à família há muitos anos. Tinham poucas amizades e raramente eram vistas em festas ou mesmo em cerimônias religiosas, ocupavam-se basicamente da criação de porcos.
Quando tinham 15 e 16 anos, a mãe delas falece. Com essa perda Dandara, a mais velha que sempre se destacou na escola, achou ser à hora de buscar novos caminhos em uma cidade maior.
Muda-se para São Paulo, vai morar em um pensionato para moças, muito comum na época.
Inicialmente, conseguiu um emprego como vendedora de um pequeno comércio de roupas para mulheres. Com o passar do tempo, mais experiente, trocou de emprego indo trabalhar numa loja maior, onde poderia ganhar um bom dinheiro pelas comissões pagas com as vendas efetuadas.
Isso lhe permitiu cursar uma faculdade e, mudar de patamar na escala social.
Formada em enfermagem, já tinha um emprego bem remunerado.
Sua irmã Daniella, seguia no interior levando o dia a dia mais difícil, entretanto, gostava de viver em isolamento. Não pensava em mudar sua vida, nem tinha muitas possibilidades para isso, pois, não havia nem mesmo concluído o ensino primário. Estudar nunca foi o seu forte.
Dez anos depois de sua ida para a grande cidade, Dandara, agora com 26 anos, havia comprado um carro, pagava as prestações de um apartamento financiado na planta, mas, que já havia sido entregue e onde morava.
Ainda na faculdade, a enfermeira havia conhecido um rapaz por quem estava perdidamente apaixonada e, fazia planos de casar-se com ele, estava muito feliz.
Certo dia recebeu notícias de Daniella que estava muito doente sem que os médicos descobrissem a causa. Condoída com a situação da irmã, tira férias no emprego e vai até sua cidadezinha para buscá-la. Apesar de ser da área da saúde, encontra muita dificuldade para marcar consultas em hospitais públicos. Havia muita demora muito descaso e, angustiada, com a penúria da irmã resolveu fazer algo que mudaria a sua vida.
Como ambas se pareciam, marca uma consulta em seu nome com um médico de seu convênio e manda a irmã para a consulta em seu lugar, levando seus documentos.
Sentido dificuldade para fechar o seu diagnóstico, em virtude da gravidade que o caso apresentava, o medico solicitou internação imediata da paciente. Ela recebeu todos os cuidados disponíveis, contudo, ainda na fase de exames, Daniella falece.
O atestado de óbito é emitido em nome de Dandara, a causa da morte no óbito foi falência múltipla dos órgãos.
Dandara sabia que poucas pessoas iriam participar do breve velório, mas contava que ao menos, seu namorado aparecesse. Veste-se e arruma os cabelos como sua irmã costumava usar, coloca, inclusive, seus óculos, temendo ser reconhecida por qualquer um. No entanto, pretendia contar para seu namorado que tudo não passara de um enorme engano, nada fora planejado, era para ser apenas uma consulta médica, mas, sua irmã morreu usando sua identidade. Achou normal que os vizinhos não viessem afinal o prédio acabara de ser entregue e as pessoas ainda estavam se conhecendo. Seus colegas de trabalho não foram avisados, mas para seu espanto, tristeza e desapontamento, nem mesmo o seu namorado apareceu no velório.
Após a cerimônia de cremação, Dandara foi para seu apartamento. Sua cabeça girava aturdida por um turbilhão de pensamentos ruins. Sabia que revelando a troca de identidade poderia responder processo pela falsa identidade, mas, que sendo Daniella não teria seu emprego, não poderia trabalhar em sua profissão, o diploma era em nome de Dandara. Consumia-se buscando uma saída e imaginando o que teria ocorrido com Genuíno, o seu grande amor.
Ficou recolhida e sem contato com ninguém. Passados cinco dias, recebe uma mensagem que dizia:
_Sou Ambrosio, gerente do Banco Nossa Embalagem, preciso ter contato com a senhora Daniella, favor comparecer a nossa agência.
Dandara apavorou-se, o que poderia ser? Na manhã do dia seguinte ela vai bem cedo ao Banco e, apresenta-se como Daniella. Lá, ouve do gerente: _Dona Daniella, fui eu quem tratou do financiamento do apartamento de sua falecida irmã e ela para me ajudar a cumprir metas naquele dia, fez um seguro indicando a senhora como beneficiária. O valor da apólice é de RS 3.000.000,00 e essa quantia está à sua disposição. Além disso, no ato do financiamento foi feito seguro obrigatório destinado à quitação do imóvel em caso de morte do financiado, assim, o saldo devedor de seu apartamento fica quitado, já que o imóvel esta livre de ônus.
Dandara estava pasma, nem se lembrava de ter feito esses seguros. As coisas estavam se enrolando cada vez mais. Antes, já estava difícil de contar a todos a verdade e agora, então!
Envolta em seus pensamentos e reclusa em seu apartamento, Dandara ouve a campainha da porta. Ao abri-la se depara com Genuíno. Intimamente pensa se não me reconhecer não lhe contarei nada agora, e este inicia a conversa dizendo:
_ Dona Daniella, sou Genuíno, fui namorado de sua irmã Dandara, ela deve ter falado de mim para a senhora. Não pretendia incomodá-la, mas gostaria de lhe dizer que para comprar esse apartamento ela me pediu R$ 50.000,00 emprestados, aqui esta a nota promissória que ela assinou, quero saber se a senhora ira honrar a divida dela. .
Dandara, atônita, aturdida, sabe naquele momento não poderia revelar sobre a troca com a irmã. Na verdade, era ele quem lhe devia RS 10.000,00. Ele sabia sobre o seguro, afinal eram íntimos e ela partilhava sua vida com ele. Agora, ele se revelava o canalha que sempre fora, mas, que ela, cega de amor, nunca havia notado. Ele poderia chantageá-la sabendo da verdade, então, resolve que é mais seguro pagar a nota promissória com sua assinatura, grosseiramente falsificada.
O rapaz vai embora e ela começa a traçar mentalmente sua vingança.
E analisa a incrível reviravolta de sua vida. Como um amor pode morrer de repente dando lugar a um grande ódio. Todo seu afeto e empenho agora davam lugar a um único desejo: dar uma lição inesquecível ao seu grande ex-amor.
Coloca o apartamento a venda. Compra um celular que ela não usaria para ligações e sim para uma armadilha.
Para vender o imóvel rapidamente pede um preço menor do que o de mercado e, consegue um comprador de imediato. Pede o prazo de uma semana para mudar-se. Escreve uma carta, destinada ao canalha do ex-namorado, identificando-se como Dandara e coloca dentro de uma pasta de couro que ela usava para transportar documentos. Liga para Genuíno:
_ É Daniella, irmã da Dandara, encontrei uma carta de minha irmã onde ela me dá varias instruções no caso de sua morte. Acho que ela sabia que estava muito doente. Ela pede para lhe dar uma pasta de couro de presente, que segundo ela, você gostava muito.
Realmente, Genuíno adorava aquela pasta, inclusive, já havia pedido para usá-la, eventualmente, em alguns negócios. Assim, vai de imediato buscá-la.
Já em casa, enquanto limpava a poeira da pasta, encontra dentro dela a carta escrita por Dandara: _Meu amor, temo estar muito doente. No caso de me acontecer o pior, vou precisar de você para ajudar minha irmã, pois ela não tem muito preparo para certas coisas. Vinha escondendo de você minha doença e, me tratando com médicos particulares que me fizeram tomar um empréstimo de RS 60.000,00 com uma amiga que, não me pediu nada como garantia de pagamento. Mas, para me sentir menos desconfortável com esse empréstimo resolveu deixar jóias de família, muito valiosas, com ela. Quero que você vá com minha irmã até ela, seu nome é Helga, o número de seu celular está anotado abaixo. Peça para minha irmã resgatar essas jóias, pagando minha amiga com parte do dinheiro do seguro que deixei, afinal, essas peças devem seguir na família. Na verdade, o número deixado era referente ao daquele celular que Dandara havia comprado. Genuíno, mau caráter, cai na armadilha e, vê ali a possibilidade de lucrar, ainda mais com a morte da namorada. Pensa que se Daniella nem sabia dessas jóias, por que alertá-la agora indo pagar pelo empréstimo? Ele usaria o dinheiro ganho, com a falsa promissória, para fazer o pagamento e, ficaria com as jóias. Imediatamente, liga para o celular da tal Helga.
Como Dandara comprara o celular como parte de sua trama, sabia que só Genuíno ligaria, então, quando ele chamou, foi logo atendendo com sotaque alemão:
_ “Helga falando”!
_Sou Genuíno, namorado de Dandara. Como amiga você já deve saber que ela estava muito doente e antes de falecer me pediu para no caso que algo pior viesse a lhe acontecer, encarregou-me de saldar a dívida de empréstimo que tinha consigo e, receber de volta as jóias de família em seu poder. Podemos fazer isso amanhã?
Dandara ou Helga responde: _Não posso se não for hoje, não sei quando será, estou saindo de viajem para a Alemanha e ficarei por lá muito tempo.
Caso não possa esperar pela minha volta, poderá encontrar-me no aeroporto internacional às 18 horas, em frente ao jornaleiro. Por favor, prefiro receber a quantia já convertida em Euros ou Dólares, me facilitará seu uso na Europa. Também, se puder coloque tudo em uma pasta que não chame muita atenção, estarei a sua espera.
Genuíno confirma que lá estaria, foi ao banco, retirou os RS 10.000,00 para inteirar os RS 60.000,00, usando seu limite de cheque especial. Segue as instruções de Helga, usa a pasta que “herdou de Dandara” e na hora marcada já esta no local do encontro.
Trajando roupas típicas e com sotaque, ninguém imaginaria estar diante de Dandara, e após as apresentações, ela pergunta a Genuíno do por que ele e, não a irmã estaria pagando a sua divida. O escroque, diz que Daniella teve medo de portar tanto dinheiro e pediu a ele para fazer o pagamento. Helga, não leva adiante o assunto e retira de uma bolsa enorme um colar lindíssimo, brincos, e anéis dizendo: _ “Essas são as jóias, confira”.
Genuíno fica encantado com tanta beleza, realmente, aquelas jóias valeriam e renderiam muito para ele. Assim pensando, efetua o pagamento e se despede sem mais delongas.
No dia seguinte, pela manhã, Genuíno vai até a uma joalheria, de muita tradição na cidade, pretendendo vender as jóias. O joalheiro se interessa pelo negócio e, examina as peças e ao final afirma._ “São peças lindíssimas, bem feitas, mas nós não trabalhamos com bijuterias”. Genuíno se espanta com aquela afirmação. _ “Como assim, bijuterias”! São “jóias de família, devem valer uma fortuna”. Só se dá conta que realmente as peças nada valem após ouvir de três joalheiros a mesma coisa. Indignado, vai até ao aeroporto tentar descobrir para qual cidade da Alemanha, ela havia viajado. Descobre que no dia anterior não houve vôo para àquele pais. .
Então se dirige ao apartamento de Dandara, agora de Daniella e lá descobre que dias antes ela havia deixado o apartamento este fora vendido.
Desesperado, Genuíno resolve ir até a policia e, diante do delegado conta que, possivelmente, havia caído num golpe.
Lendo a carta onde Dandara pedia que a irmã efetuasse o resgate das jóias, o delegado diz _ “Amigo”, não vejo aqui golpe algum! A falecida pedia para a irmã dela, com o dinheiro dela, pagar à amiga recuperando as jóias. Não entendo o motivo pelo qual o senhor vem como vítima prestar queixa!
_ “Tanta gentileza, pagar uma dívida grande dessas! Será que não seria o senhor quem pretendia aplicar um golpe”?
Genuíno fica sem palavras, realmente, não conseguiria incriminar ninguém e o que era pior, no máximo, levantaria suspeita sobre si mesmo. Pede desculpas ao delegado e, se retira da delegacia antes de mais perguntas.
Tempos depois, Genuíno resolve ir até o local onde, imagina que tenham sido jogadas as cinzas da namorada. Lá, depois de muito refletir, termina com os seguintes pensamentos:_É, minha querida, por linhas tortas paguei por minha ambição!Quis dar um golpe em sua irmã, mas acabei sem nada. Sem, até mesmo, os RS 10.000,00 que eu lhe devia, e estou atolado em dividas no banco com os juros do cheque especial, sequer fiquei com sua pasta. Acho que mereci perder tudo. O fato é que toda essa situação me ensinou a não cobiçar o que não é meu, e ter apenas o que puder adquirir com meu trabalho. Descanse em paz meu amor!
Enquanto isso, bem longe dali, Dandara, agora Daniella, estava morando em uma aldeia indígena, onde poderia exercer sua profissão, sem cobrar nada, sem perguntas, e, sem levantar suspeitas.
Jamais haveria volta para ela. Com o nome da irmã e suas impressões digitais, pôde tirar novos documentos sem maiores problemas. Daniella era muito reclusa e nunca precisou deles, nunca saiu daquele pequeno mundinho. Em suas reflexões Dandara não se arrependia de nada. Sentia-se bem por poder fazer o que gostava cuidar de doentes que não teriam a quem recorrer se não a ela. Adorava os pequenos indígenas a quem chamava de seus meninos e era uma mulher realizada, mas, seu coração ainda estava “fechado” para novos romances, talvez com o tempo, já que havia um sertanista que a cortejava.
Com os rendimentos, da aplicação do dinheiro que recebeu do seguro de vida e da venda do apartamento, não precisava de mais, tinha o suficiente inclusive para ajudar aos necessitados.
Matriculara-se num curso supletivo para iniciar os estudos do zero já que, sua irmã não havia completado nem o ensino fundamental. Tinha pretensão, de ainda, um dia formar-se enfermeira novamente, agora como Daniella.
Pedia a todos que a chamassem por DAN, pois a única dúvida que lhe vinha à cabeça vez por outra era “QUEM SOU EU”, Dandara ou Daniella?
FIM - por Tito Cancian - italianodeoderzo@hotmail.com
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