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Relacionamento Abusivo Ouviu o barulho dos pneus cantando na frente de casa. Abriu as janelas e esfregou os olhos na esperança de que tudo aquilo não passasse de um terrível pesadelo. Viu o namorado enfiado dentro de um carro preto, os olhos injetados de raiva, as mãos firmes presas ao volante enquanto acelerava o veículo, parecia transtornado.
Já passava das três da manhã de uma sexta-feira e não demorou muito para que outras janelas se abrissem e que luzes se acendessem nas residências vizinhas. E não custou muito para o pai começar a dar socos na porta de seu quarto.
- Abre essa porta Letícia! – A voz de seu pai era firme, bem diferente dos lábios dela que tremiam de medo e apreensão. Letícia levantou-se rapidamente, destrancou a porta e voltou a sentar na beirada da cama, sem reação, o coração aos pulos. O pai de Letícia entrou feito um furacão no quarto.
- Manda esse moleque embora daqui! – Exigiu o pai; ela não sabia o que fazer, enquanto isso era possível ouvir os vizinhos reclamando da algazarra.
Enquanto o pai de Letícia se retirava momentaneamente do quarto, ela começou a se recordar da última briga. Dos tapas que levou, dos arranhões que deu, do puxão de cabelo que ainda doía e da sensação de impotência que a cercava. Eram quatro anos de um relacionamento abusivo. Um namoro prejudicial e que teria consequências sérias se ela não desse um basta naquilo. Por vezes apanhou do namorado, por tantas terminou, mas na mesma velocidade com que terminava, reatava jurando ainda mais amor a ele.
Abria-se para as amigas se dizendo apaixonada, mas na primeira agressão mudava de ideia e sua opinião sobre o namorado mudava radicalmente. Viu o pai retornar com o celular em punho, o olhar de raiva em seus olhos enquanto ela de cabeça baixa tentava por os pensamentos em seu devido lugar.
Vestida num pijama cheio de pequenos corações ela desceu vagarosamente as escadas. O frio sentido por ela não tinha nada a ver com o clima lá fora, estava um calor insuportável, o que ela sentia dentro dela era o coração gelar e a garganta se fechar num sufocamento inexplicável.
Na rua, luzes permaneciam acesas; olhares curiosos apontavam para o carro preto, e o jovem de cabelos castanho escuro e olhos verdes, continuava acelerando feito um louco na frente da casa da moça. E quando ela finalmente abriu o portão e saiu, calçando chinelos e com as mãos num tremor assustador ele resolveu sair do carro. O som da porta se abrindo deixou a vizinhança toda apreensiva; na mão direita o telefone celular, na mão esquerda uma pistola, já engatilhada, pronta para ser disparada.
Então Letícia caminhou na direção do namorado, pedindo pelo amor de deus que ele parasse e fosse embora, eles conversariam mais tarde e com mais calma como duas pessoas civilizadas fariam, entretanto não deu outra, com o braço esticado ele mirou e atirou. O barulho surdo do tiro, a fumaça saindo do cano da pistola, um grito de dor, e as mãos sujas de sangue. O pai de Letícia saiu correndo e pôde ver a filha de joelhos, com lágrimas escorrendo no rosto e um sorriso de despedida na cara. O namorado baixou a pistola por um instante, mas ergueu novamente quando o pai de Letícia se aproximou dele.
Com a filha nos braços, já sem vida, ele olhou com raiva para o rapaz. Ele por sua vez deu um sorriso de deboche, levantou a arma, apontou na direção do sogro. Outro tiro e o barulho da queda do corpo no chão, o rapaz também estava morto.
Quando a gente gosta de alguém é necessário existir respeito e cuidado de ambas as partes. Não adianta ficar criando expectativas em cima de um relacionamento que não dará frutos. E quando existe agressão, falta de amor, é melhor acabar com tudo, senão a relação acaba como terminou a de Letícia e do namorado, em tragédia e com o pai desolado, segurando a filha sem vida nos braços.
FIM...
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