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A maior mentira de ChicóChicó contava vantagem,
Mas o povo não ligava,
Toda noite para ouvi-lo
A multidão se ajuntava,
Porém não tinha sequer
Um que nele acreditava.
João Grilo dizia sempre:
— Chicó, tenha mais cuidado,
Pois a sua língua grande
Pode deixá-lo enrascado
Se um dia se deparar
Com algum cabra malvado.
Chicó dizia: — Qual nada!
Nunca me meto em engano:
Já irriguei o deserto
Com as águas do oceano,
Mandei fazer uma ponte
Ligando Marte a Urano!
Já matei onça de tapa
E leão com pontapés,
Já tirei água de pedra,
Como um dia fez Moisés,
Em casa tenho uma árvore
Que produz contos de réis!
João Grilo disse: — Chicó,
Nem mesmo lá em Pequim
Um pé-de-pau dá dinheiro
Ou a água do mar tem fim.
Chicó respondeu: - Não sei;
Eu só sei que foi assim...
Porém, meu amigo João,
Agora vou lhe contar
Uma história verdadeira,
Dessas de se admirar,
Que mesmo o cabra incrédulo
É forçado a acreditar:
No sertão do Ceará
Vi três matutos correndo
Atrás de uma tartaruga –
Parece que inda estou vendo –
Mas vou descrever os três
Pra você ficar sabendo.
Cada um deles levava
Consigo uma carrapeta.
Mas o primeiro era mudo
O segundo era perneta;
Já o terceiro era cego,
O quarto surdo e maneta.
E foi o cego quem viu
A tartaruga matreira.
O mudo falou pra ele:
— Acabou-se a brincadeira!
Depois gritou o perneta,
Que se danou na carreira.
Mas quem pegou a bichinha
Foi o sujeito cotó,
Vendeu-a para um mendigo,
Ficou mais rico que Jó.
É a mais pura verdade,
Quem lhe garante é Chicó.
Mas isso, João, não é nada,
Já fiz coisa mais incrível
Que, se lhe contar, você
Pensará ser impossível.
Pra você pode até ser,
Mas não pra alguém do meu nível.
Eu tenho um grande criame
De abelhas no meu quintal.
Tentei contar as colmeias –
Confesso que passei mal –
Pois nem em quinhentos anos
Descobriria o total.
Porém contei as abelhas,
Que passavam de um trilhão!
Vendo que faltava uma,
Quase perdi a razão
Mas para minha alegria,
Vi o seu rastro... no chão.
Entrei mata adentro e vi
Minha abelhinha caída,
Com duas raposas velhas
Numa batalha renhida.
Saquei de grande peixeira,
Pra defender minha vida.
Rumei a peixeira nelas,
Que saíram em disparada;
A peixeira se perdeu
Dentro da mata fechada.
Então, matutei um jeito
De sair desta embrulhada.
Logo peguei o meu binga,
Fogo na mata botei,
E desta forma, as raposas
Pra bem longe afugentei.
Quando o fogo se apagou,
Minha peixeira encontrei.
Porém sobrou só o cabo,
O ferro foi derretido.
Corri até o ferreiro,
Contei o acontecido:
E pedi que refizesse
O ferro, que foi perdido.
Mas ele se confundiu
Por ter cabeça de vento
E me fez um anzol reto
Pra eu pescar ao relento.
Joguei o danado n’água,
Puxei e veio... um jumento!
Veio com bruaca e tudo,
Então nele me montei.
Os quartos da abelhinha
Fujona, avante encontrei.
Quando espremi, dez mil litros
De mel bem puro tirei!
Porém não tinha os barris.
E estando no mato só,
Resolvi armazenar
Todo o mel no fiofó
Do meu jeguinho, contudo,
Confesso: fiquei com dó.
Passado algum tempo houve
No sertão grande secura;
Nas costas do meu jumento
Cresceu grande matadura,
De tanto carregar peso
Em sua jornada dura.
O jumento carregava
Bastante mercadoria
E, para minha surpresa,
Presenciei, certo dia,
Germinando em suas costas
Feijão, milho e melancia.
Então, peguei o machado
E dei um golpe no centro
Da melancia, porém
O machado caiu dentro.
Olhei o buraco e disse:
— É aqui mesmo que eu entro!
Lá dentro da melancia
Avistei em disparada
Um vaqueiro procurando
A sua enorme boiada.
Pedi seu adjutório:
Ele me deu uma escada.
Para subir os degraus
Foi terrível o escarcéu,
Pois saí da melancia
E fui bater lá no céu.
Lá Maria Madalena
Me ocultou em seu véu.
Acabei voltando à Terra
Cavalgando num corisco,
Que caiu em Xique-xique,
Nas bandas do São Francisco,
Mas aprendi a lição –
Hoje sou um cabra arisco.
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