Efuturo: MELANCÓLICA CRÔNICA DE UM ALIENÍGENA DISFARÇADO EM AUTOR DE FICÇÃO-CIENTÍFICA

MELANCÓLICA CRÔNICA DE UM ALIENÍGENA DISFARÇADO EM AUTOR DE FICÇÃO-CIENTÍFICA

MELANCÓLICA CRÔNICA DE UM ALIENÍGENA DISFARÇADO EM AUTOR DE FICÇÃO-CIENTÍFICA

Roberto Schima

Temíamos assustá-los.
No fluir das eras e nas raras aparições, transformaram-nos em monstros ou alçaram-nos ao panteão dos deuses.
De minha parte, disfarcei-me de humano, de autor de ficção-científica para, através dos textos, familiarizá-los com a existência de outros seres, outras tecnologias, outras perspectivas, vivendo em outros planetas, em outras realidades, outro tempo e, até em seu próprio lar: a Terra, fosse em retiros isolados como nas profundezas marinhas ou no cimo das mais elevadas e tempestuosas cordilheiras. E, inclusive, entre eles, lado a lado, em um clube de ficção-científica ou na fila do supermercado, sem que dessem conta disso. Até tacharam-me de um termo pejorativo: “nerd”, embora aqui no Brasil alguns – minoria é verdade – optassem por uma curruptela pior ainda: “merd”. Outros como eu fizeram o mesmo, e tiveram mais êxito em outras dessas divisões tribais chamadas nações: criaram roteiros para o cinema, deram palestras em universidades sobre exobiologia, lecionaram astronomia, escreveram livros, desenvolveram projetos de busca de vida inteligente por meio de radiotelescópios ou enviando satélites para a descoberta de mundos em outros sistemas solares. Até mostraram nosso próprio planeta entre eles! Nessa ocasião, fiquei arrepiado, todavia, como os humanos haveriam de saber?
Tudo para dizer que existimos, que acompanhamos a vida neste mundo bem antes que a vida, propriamente, existisse.
Tudo para prepará-los para o derradeiro momento: a nossa completa e real revelação perante a humanidade.
O grande contato imediato do terceiro grau.
Evitar o maior dos choques culturais.
Não somos deuses...
... nem monstros...
... não obstante a tendência dos últimos filmes mostrarem os alienígenas como os vilões da história. (Meus colegas garantem que não foram obras deles!)
Ao menos no plano das idéias, suposições, fantasias e - malgrado seja - piadas, aceitaram-nos. Passaram a inventar suas próprias mitologias, histórias e filmes. Os efeitos especiais no cinema que, a princípio espantavam, hoje não causam surpresa. Jovens cientistas, impulsionados pelas idéias exibidas, tornaram realidade algumas delas e inventaram outras que ninguém havia cogitado.
Sentimo-nos felizes como pais observando seus filhos caminharem sobre os próprios pés.
O mundo mudou e tem mudado aceleradamente.
Até eu próprio, há tantos séculos aqui, sinto dificuldade em acompanhá-lo.
Nem tudo é bom, nem tudo são flores. Há muitos erros por corrigir, todavia, quem já não os cometeu? Nós é que não fugimos à regra...
Estão preparados.
Não obstante...
Agora, sinto, o temor cedeu lugar a um certo receio: o receio de desapontar.
Artigos, livros, músicas, filmes, páginas na Internet, retratam extraterrestres de uma maneira que nunca fomos nem jamais seremos.
Não somos grandiosos, não temos tamanho de edifícios e nem somos capazes de ressuscitar os mortos, embora tenhamos legado-lhes um paliativo: à clonagem. Não expelimos raios pelos olhos e nem temos uma luz na ponta do dedo. Somos criaturas, digamos, comuns; fomos criados pela mesma ação da Natureza que tornou o céu azul, trouxe o nevoeiro nas manhãs de inverno ou deu asas aos pássaros e às borboletas. Ah, sim, é um consolo para nós dizer que também não somos nanicos de pele verde e antenas, ou calvos e cabeçudos.
Depois de tanta espera, tantas especulações e preparo, eu e meus iguais sentimos relutância em mostrarmo-nos como realmente somos e de onde realmente viemos.
Acreditarão em nós?
Mandar-nos-ão para o hospício mais próximo?
Agora, a humanidade está preparada. Fartamente preparada até, “ad nauseaum”.
Preparados não estamos nós.
Quem diria?
Em nós, agora, não há o temor de atemorizá-los, mas o próprio temor que sentimos.
Temor do desapontamento.
Temor do descrédito.
Temor de termos esperado tanto tempo em vão.
Temor de estarmos obsoletos por nossas próprias mãos.
Seja como for – e como dizem – o “show” precisa continuar.
Como uma cortina que se abre e nem um aplauso sequer é ouvido.
Só o cricrilar de grilos...
... sem palmas para bater.



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