Efuturo: LEITURA OCULTA

LEITURA OCULTA

Escrever não veio como uma necessidade de autoafirmação, nem mesmo como um talento inato. Apenas aconteceu.
Chegou propondo uma fuga da realidade, do cotidiano, dos nossos papéis enquanto cidadãos.
É engraçado, porque escrevemos, relemos os textos, localizamos imperfeições e, normalmente, o que chega ao papel mostra-se dinâmico, refazendo-se a cada leitura.
Pontos finais transformam-se em vírgulas, mudamos do passado para o futuro, trocamos palavras repetidas e, ainda assim, cada texto é um eterno parto.
Nascem questionamentos, poemas e poesias.
Morrem certezas, julgamentos e fantasias.
É interessante, porque sabemos, no fundo, que aquele desabafo transformado em literatura dificilmente será compartilhado e, se assim acontecer, a interpretação será diferente daquela proposta pelo texto original.
Não sei como pensam os colegas escritores, anônimos ou conhecidos, mas escrever é principalmente uma terapia, uma maneira de eternizar aquele instante, importante para o autor, insignificante para o mundo.
É uma alternativa à violência, à solidão, ao desespero.
Traz respostas para o subconsciente, despejando aquela tristeza momentânea ou a alegria ansiosa por ser compartilhada.
Os personagens ou as passagens assumem características próprias, deslocando-se do autor, transitando por personalidades diversas, retornando como propostas e alternativas às posturas assumidas automaticamente durante a vida.
Escrever é gratificante, como é frustrante.
É um ato de egoísmo, pois cada letra redigida pertence ao autor.
É um ato de altruísmo, quando compartilhado, independente da interpretação alheia.
É transformar o cotidiano em algo eterno, aquela emoção momentânea em algo a ser lembrado.
Sabemos disso, escrevemos, e aceitamos a falta do entendimento daquilo que para o escritor teve importância.
O segredo, portanto, é não escrever à procura do reconhecimento.
Deve-se escrever por amor, mesmo que sejam necessárias mil palavras apresentadas para que apenas uma seja lida.
Deve-se escrever sem expectativas, buscando a excelência, mesmo que a ideia da mediocridade permaneça viva como uma dúvida.
Afinal, escrever é aceitar a própria frustração frente ao mundo.
E, sim, continuar...
Mesmo sem alguém para compartilhar.