Efuturo: A DOBRADINHA 44

A DOBRADINHA 44

A DOBRADINHA 44
O transito em São Paulo, é conhecido pelos seus engarrafamentos. Moacir que nasceu aqui em 1940 conhece varias vias que permitem um deslocamento mais rápido, ele acompanhou o crescimento da cidade, das poucas ruas que havia antes até as grandes avenidas de hoje. Esse fato nos direcionou a caminho de um supermercado passar diante ao Sambódromo, chamou nossa atenção às filas que se formavam diante dele, enormes, e até pessoas dentro de barracas. Soubemos depois que aquela fila, era para a compra de ingressos de um evento de Rock n roll que aconteceria três dias depois. Moacir apenas comentou que antes ali havia uma dezena de campos de futebol para jogadores amadores e com a construção das marginais estes perderam seus espaços.
Quem viveu em São Paulo no final da década de 50 e inicio da de 60, sabe que eventos como aquele pelo qual os jovens aguardavam pacientemente não tinham lugar. Os jovens poderiam escolher apenas ir aos estádios assistir ao futebol ou jogar em clubes varzeanos aos sábados e domingos, ir a cinemas, e nesses sim, a espera para entrar girava em torno de 3 horas de fila, assistir espetáculos de circos, e dançar em bailes de formaturas, e eram muitos, pois todas as escolas comemoravam qualquer formatura e na ausência desses os bailinhos que os jovens faziam todas as semanas na casa de alguém que tivesse uma toca disco.
Moacir tinha outro entretenimento, na verdade o que ele tinha era um vicio uma compulsão por apostar em corridas de cavalos. Naquela época, era comum nas famílias de origem italiana, seus membros entregarem as mães ou esposas o envelope de pagamentos, para que essas os administrassem, e aos finais de semana cada um encontrava em cima de sua cama dinheiro suficiente para a compra de cigarros e ingressos de cinema, e condução por bondes. Assim, Moacir ao receber nos finais de semana sua parte, já tinha destino certo o Jockey Clube. Contudo o ingresso naquele logradouro era destinado as maiores de 21 anos, e dessa forma na maioria das tentativas Moacir não conseguia entrar para fazer suas apostas. Descobriu então que em três noites por semana, havia corridas de trote no hipódromo da Vila Guilherme.
O problema seria o mesmo, a proibição era idêntica, 21 anos, mas Moacir descobriu uma forma de ali entrar. Em volta do hipódromo, haviam cercas de arame farpado e não muros como no jockey clube, e essas não o impediam de passar por elas, dessa forma, passou a frequentar a Sociedade Paulista de Trote com enorme frequência, a mesma que o levava vir a pé até a sua casa no bairro de Santa Cecilia, uns 10 quilômetros de distancia, já que invariavelmente ele apostava até o ultimo centavo nas patas dos cavalos.
Para quem acredita, vou chamar de destino, para os incrédulos apenas um acontecimento normal, seja de que forma encare o fato, aquela noite Moacir teria sua vida mudada para sempre. Chegara o ultimo páreo das corridas, e ele tinha pouco mais que o dinheiro das passagens dos ônibus para voltar em seu bolso, habituado a caminhar pela madrugada fria da cidade, pouco se importou em jogar seus poucos recursos em uma aposta que jamais poderia ser premiada. O cavalo numero um, (Corsário) ou da chave um, era o franco favorito, quem apostasse nele, receberia seu dinheiro de volta, o numero dois, (De vil) e da chave dois, era o segundo mais apostado, e pagaria o dobro do apostado, o de numero três e da chave três, (Apassionata)) já pagaria cinco vezes o valor das apostas, e os dois que compunham a chave quatro (Le Tofane e Aguateira) pagavam mais de 500 vezes o valor da aposta.
Moacir, por desespero, decidiu apostar que estes chegariam um em primeiro e o outro em segundo, e fazendo a dobradinha 44.
Na corrida de trote os cavalos puxam um sulk, ou popularmente chamada de carrocinha, o animal tem que trotar e vence quem chegar a primeiro lugar, e forma a dupla ou dobradinha o segundo colocado. As largadas são feitas com os sulks em movimento giratório, e quando estão todos alinhados é dada a partida soltando-se um elástico grosso que serve como linha de partida.
A sorte de Moacir tem inicio logo na largada, o elástico ao ser solto atinge o focinho do cavalo numero três, (Apassionata) e este refuga e se atrasa muito aos outros, mas a corrida era longa, uma volta inteira na pista cerca de mil e quinhentos metros. Logo o cavalo numero um dispara livrando boa vantagem do numero dois e a seguir os dois da chave quatro, na reta oposta de onde os apostadores acompanhavam o páreo, percebe-se que o cavalo numero um passa a ser muito lento, tão lento que chegou a ultimo lugar. Os sulks são de pneus, maiores, mas iguais aos das bicicletas, e um deles furou antes dele entrar na pista, ninguém percebeu, e este apenas murchou durante a prova, e com um dos pneus furado ele se arrastou até a linha de chegada. Estava claro que o cavalo numero dois venceria facilmente a corrida, os da chave quatro distavam dele 30 metros. Na curva final, pouco mais de 300 metros para o disco de chegada, fora do hipódromo em alguma comemoração, pessoas soltaram rojões, e um deles caiu próximo dele. Assustado com o estrondo o animal deixa de trotar e passa a galopar o que leva a desclassificação.
Assim apenas restava os dois animais da chave quatro que eram tão lentos que por pouco o cavalo numero três que se atrasara na largada os alcança.
Moacir nem sabia quanto havia ganhado, mas correu logo para a fila onde eram feitos os pagamentos das apostas e pegar um bom lugar, para sua surpresa apenas ele ali estava. Recebeu uma quantia gigantesca de dinheiro, mentalmente pensou não ganho essa bolada nem em dois anos de trabalho. Apavorado com a possibilidade de ser assaltado, ainda dentro do hipódromo toma um taxi e se dirige para sua casa.
Não contou para ninguém o ocorrido, escondeu muito bem seu dinheiro, no dia seguinte, foi trabalhar normalmente.
Moacir era um rapaz que fazia amizades facilmente, e em seu emprego uma loja atacadista que vendia ferragens e ferramentas ele era amigo de todos os vendedores viajantes, um deles por nome OSWALDO, estava em São Paulo, coisa rara, pois todos eles passavam perto de um mês em viagem, o convida para passar aquele final de semana em sua casa em Botucatu, a cidade dista da capital 230 quilômetros, mas de trem á época levava-se 5 horas dentro dele até o destino final. Moacir pensou, é lá que iniciarei gastar aquela bolada que ganhei, e aceitou o convite, mas gostou tanto da estadia que convenceu seu amigo a ficar por lá uma semana inteira. Quando voltaram, Francisco, o contador da empresa que não nutria muita simpatia por Moacir, viu ali a possibilidade de demiti-lo e o fez e também a Oswaldo.
Meses antes, o gerente da firma de nome Viomar, se demitira e montou em sua casa algo que modestamente concorreria com seu ex-patrão. Vendia apenas na capital, com a demissão de Moacir e Oswaldo, chamou-os para trabalhar com ele.
Moacir aceitou ser vendedor, mas Oswaldo aceitou a proposta, mas entrou como sócio na pequena empresa.
Oswaldo vendia no interior e Moacir na Capital, Viomar efetuava as compras embalava e entregava as mercadorias. O negocio prosperou a ponto de um dia Viomar dizer a Moacir que precisava dele para fazer algumas viagens também. Mesmo estudando no 1º ano do curso cientifico à noite Moacir topou a proposta, até porque suas comissões nas vendas triplicariam, e dinheiro era uma palavra magica para Moacir. Mas o destino que já havia traçado caminhos diferente para ele quando ganhou a bolada na dobradinha 44, preparava mais uma trama da teia.
Moacir repete o ano por faltas, mas pouco se importou, adorava o que fazia e mais do que ganhava. No ano seguinte Moacir matriculou-se novamente no 1º ano. E foi fazendo uma viagem à Sorocaba que um dos clientes lhe alertou._ “Seu antigo patrão esta na cidade, e com um Gordini, logo chegara aos clientes na sua frente”. Moacir não se importou com a noticia, pois SR. Macedo tinha um carro, mas ele a pé chegaria antes, pois sabia onde ficavam seus clientes diferentemente do ex-chefe.
E de fato isso ocorreu. Em todos os clientes era habito afixarem-se em um prego enorme todas as correspondências e papeis, e foi assim que Macedo encontrou em todos os fregueses comuns um pedido tirado por seu agora concorrente.
No primeiro dia útil a esta viagem, Moacir já em São Paulo e, apenas viajaria dois dias depois, ao sair da loja, notou a metros dali o carro azul, o Gordini do Sr, Macedo, ao atravessar a rua, notou que ele acendia e apagava o farol chamando-o para uma conversa.
_Seu Moacir. Nunca soube que queria ser vendedor viajante, ao que ele respondeu.
_ Foi o Francisco seu contador que me boicotou durante anos.
_ ¬¬Mas o senhor sabe que ele já não esta mais na firma, também abriu outra para concorrer comigo.
_Sei disso já encontrei com o viajante dele por ai. Então vem à proposta inusitada.
_Seu Moacir o senhor ganha quanto? Moacir exagerou e falou algo bem maior que o real, e Seu Macedo completa,
_Eu lhe pago o dobro para que seja o meu gerente de vendas.
Bastaria àquela proposta para Moacir aceitar de imediato, mas ele sem demonstrar ansiedade pela oferta diz.
_Aceito, pois perdi o ano de estudo com minhas viagens.
Demitiu-se e já no dia seguinte apresentou-se ao seu ex e agora novo patrão.
Entre os três concorrentes a firma do S.R. Macedo era a maior delas e mais bem estruturada, contudo vinha perdendo em vendas para as outras duas por falta de pequenos detalhes que Moacir logo no primeiro mês, com suas orientações possibilitou que o faturamento triplicasse. Esse fato fez com que seu patrão agradecido desse de presente a Moacir o seu primeiro carro uma Romi-Iseta.
Chegou o primeiro dia de aulas, todos os seus ex-companheiros de turma haviam passado de ano e estavam na 2ª serie do curso cientifico, mas não se importou, fez novas amizades, e entre eles Oriswaldo, um rapaz de Minas Gerais que estava em São Paulo iniciando seus passos para ser um dia Engenheiro Civil fato que jamais alcançou. Ambos foram campeões do campeonato interno de futebol de salão, e a amizade aumentou entre eles, a ponto de um dia Oriswaldo convida-lo a conhecer sua cidade por nome Prata- MG, Moacir acostumado a viajar aceitou de imediato.
A cidade distava 600 quilômetros de São Paulo, hoje de carro demorasse 6 horas, naquele dia ele levou de ônibus 20 horas viajando.
O município, era pequeno, na primeira noite, a de sua chegada o motor que gerava energia para a cidade estava queimado, assim, ele chegou sob luz de vela a minha casa, mas já no dia seguinte estava tudo normalizado.
Eu era noiva de aliança de um rapaz que morava em uma cidade próxima daqui, terminei o noivado por carta juntando a aliança no envelope, ele sem compromissos. Iniciamos um namoro à moda antiga, e dois anos depois nos casamos.
Mas vó, por que seu conto leva o nome de A DOBRADINHA 44?
Pense comigo, Se seu avô não acerta aquele jogo, não teria dinheiro para viajar à Botucatu, não ficaria por lá uma semana e não teria perdido o emprego, dessa forma não teria perdido o ano por faltas, e não teria conhecido meu irmão Oriswaldo, e sem essa amizade não teria me conhecido, e nenhum, de vocês teria nascido, pois os meus seis filhos e 11 netos sem esse casamento não estariam aqui.
_ Vó, no ultimo concurso do Talentos da Maturidade o seu conto foi o mais visualizado em literatura na região sudeste e o segundo no pais inteiro, e do vovo foi o segundo, mais de 5.000 leitores, a senhora acha que alguém vai ler uma história real como essa?
Não sei se irão ler, mas todos vocês terão conhecido como o destino cruzou o meu caminho com o do seu avo, e isso é mais importante que tudo.
Fim – por Tito Cancian – italianodeoderzo@hotmail.com
Baseada em fatos absolutamente reais