POR APENAS CINCO REAIS
POR APENAS CINCO REAIS
Era uma tarde de sábado, e para Tito, aquele momento fora destinado a sua tradicional “soneca”. Era inverno, e este induzia à acídia e desídia.
Quando se preparava para deitar, através da janela viu algumas pessoas fazendo caminhada, zombando pensou: “que façam bom proveito”.
Tito gostava de dormir ouvindo musicas. Estava ligando o CD-PLAYER, quando foi interrompido pelo seu filho único de cinco anos: _ Pai, eu quero comer jujuba!
_Filho, hoje é sábado, ta tudo fechado. Este imediatamente retruca:
_Não tá não! Lá no supermercado tem uma máquina e é só colocar uma moeda de R$ 1,00 que sai um montão de jujuba!
Tito sabia que não adiantaria argumentar, o menino não abriria mão da jujuba. Desligou o som, e saiu em busca de uma moeda.
A menor quantia encontrada foi uma cédula de R$ 5,00, em cima da cama de seu cunhado que também morava na casa. A nota era tão novinha, que parecia fazer parte de uma coleção.
O cunhado não estava para ser avisado, mas diante da situação, resolveu usar a nota e explicar sua necessidade depois.
O supermercado ficava um quilometro dali, ele poderia até ir a pé, mas preferiu usar seu carro. Nesse caso, voltaria logo e, enfim poderia dormir o restante da tarde.
Foi o que fez, mas três quadras de seu destino, ao parar num semáforo, foi abordado por um menino de aproximadamente 12 anos que lhe perguntou:
_Moço, quer comprar um distintivo de “XERIFE”? O senhor me ajuda e ainda agrada um sobrinho ou um filho. _Quanto custa?_R$ 1,00, respondeu o rapazola.
Tito pensou: eu preciso mesmo trocar esse dinheiro, compro, ajudo o garoto e resolvo a questão da moeda para a máquina de jujubas.
Comprou o distintivo que era de metal, colocou-o no bolso da camisa junto com as moedas do troco e, saiu cantando pneus.
Já no próximo quarteirão, o trânsito e interrompido. Havia um tiroteio sendo travado entre policiais e bandidos. E Tito é atingido por um dos disparos, bem no peito.
Socorrido, é levado a um pronto socorro bem próximo dali onde é submetido a exames.
Depois de minutos de muita tensão, vem à agradável surpresa: o projétil atingiu o distintivo de metal e as moedas, que acabaram salvando a sua vida, mas foi um grande susto.
Ao voltar para casa, por volta de 20,00 horas, Tito constatou que sua sogra já fora ao supermercado e comprado às jujubas que quase lhe custaram a vida, mas o “problema” estava resolvido.
Ao presentear seu filho com o distintivo de xerife, ainda ouviu dele reclamação de que o objeto estava amassado. Enquanto detalhava o ocorrido aos seus familiares, recebe outra má noticia de seu cunhado:
_Tito, aquela nota não era verdadeira, era uma cópia Xérox feita para testar uma máquina nova que adquiri para meu escritório. Esse menino terá problemas se for pego com a cédula falsa.
Preocupado com o fato e ainda com dores, ele mal dormiu a noite.
No crástino, antes que seus familiares despertassem, Tito sai a pé para tentar localizar o pequeno vendedor. Foi logo ao semáforo onde havia sido abordado. Não o encontrando, sentou-se em um banco ali próximo e ficou por horas esperando. Finalmente, eis que surge o garoto.
Estava ele todo bem vestido, limpo e sem nada para vender.
Tito aproxima-se dele preocupado em não assusta-lo e pergunta: _Você não vai trabalhar hoje? O vendedor sorridente responde:
_Não moço, hoje não, e ainda vou tirar uns dias de férias.
Surpreso, Tito pergunta o que estava acontecendo.
_Sabe, ontem à tarde, eu só vendi um distintivo, a pessoa que comprou pagou com R$ 5,00. Eu ainda estava com ele na mão, quando um morador de rua me propôs negócio numa bolsa de mulher novinha, em troca daquele dinheiro.
Sabia que ela poderia ter sido roubada, mas pensei em minha mãe que adoraria ter uma daquela e a comprei. Impaciente Tito pergunta em cima:_Sim, mas e dai?
_Quando cheguei a casa levei uma bronca por comprar a bolsa dessa forma, mamãe revirou-a e por sorte achou o telefone e ligou para a verdadeira dona, ela, pediu que verificasse se havia um papel numerado dentro de um compartimento. Logo mamãe encontrou o que era a senha de um cofre forte, onde ela guardava todas as suas joias e dinheiro de “gringo”.
A alegria da mulher foi tanta que em seguida veio até nossa casa, deu a bolsa de presente para minha mãe, me levou até uma loja, compraram todas essa roupa nova para mim e ainda nos deu um bom dinheiro de gratificação. Estou autorizado folgar durante uma semana.
Angustiado, Tito ainda pergunta:
_Mas e o morador de rua, onde posso encontrá-lo?_ Moço, disse o menino, não faça mal ao pobre diabo, ele já está na pior! Com a garantia de nada fazer contra o desabrigado, o menino e Tito saíram à procura do tal homem.
Percorreu várias vezes todo o jardim da avenida sem êxito. Exaustos resolvem parar e tomar um refrigerante em uma lanchonete dali. Repentinamente, vários moradores de rua invadem o estabelecimento.
Tito se surpreende, pois não havia visto nenhum durante toda manhã. Estavam maus vestidos, mas um deles chamava a atenção, limpinho, de cabelos cortados, barba feita e era o mais falante. Dirigindo-se entusiasmado ao dono do lugar, diz:
_O que a turma pedir, sirva. Hoje é por minha conta!
Para garantir o que dizia foi logo exibindo varias notas de R$ 100,00 e completando:
_Taí, tenho “grana” para pagar tudo.
Tito curioso estava atento à conversa, pois ali poderia estar o homem que ele procurava. Em seguida ouve o patrocinador da festa falando em voz alta:
_Meus amigos, quero repartir a minha sorte com vocês, que como eu, sabem como é morar na rua, não ter o que comer ou beber e o pior, não ter onde dormir nos dias chuvosos.
Provavelmente esta será a única ocasião que poderei bancar a conta, mas estou feliz por isso. E entre um deles vem à pergunta:
_Conta pra nós como foi que você arrumou todo esse dinheiro? Ao que o pagador tagarela se acomoda na cadeira e inicia sua história.
_Ontem à tarde, eu estava dormindo, aqui nessa avenida, quando fui acordado com uma bolsa de mulher caindo em minha cabeça. Só deu para ver que eram dois jovens em cima de uma moto jogando a bolsa fora. Dentro dela não havia nada, só papeis. Para levantar algum trocado resolvi vendê-la para um moleque que vendia distintivos de xerife ali naquele farol.
O menino só tinha uma cédula de R$ 5,00, novinha, mas eu a vendi, pois a bolsa não me valeria de nada.
Dinheiro na mão estava eu a caminho do bar para tomar mais uns goles, quando notei os números 96 e 97 escritos a lápis na nota.
Desisti de tomar a pinga, fui até uma banca de jogo de bicho ali na esquina, e joguei no milhar 9697 no primeiro premio. E à noite, a sorte, pela primeira vez me sorriu, acertou o primeiro premio e ganhei R$ 20.000,00, assim, enquanto esse dinheiro não acabar vou dormir em uma pensão aqui perto.
Sorrindo, pagou a conta se despediu gritando. _Bendita nota de R$ 5,00.
Tito agora sabia o paradeiro do dinheiro falso. Mas era domingo, e a banca de bicho fechada. Despediu-se do garoto e voltou para casa intrigado com as citadas anotações.
Lá chegando, seu cunhado esclarece: era apenas o ano e o modelo de um carro que ele estava tentando comprar. Escreveu nela, pois não passava de uma cópia sem valor e o único papel que dispunha naquele momento.
Tito seguia preocupado com as consequências negativas acarretadas pela nota falsa de R$ 5,00. E assim foi deitar.
Quando o dia clareou, ele se levantou e foi até a banca do jogo do bicho, último destino do dinheiro. Tito se apresentou ao bicheiro que ficou desconfiado, afinal, o jogo de bicho é uma contravenção. Após contar toda história o homem as gargalhadas, conclui:
_Cara, você pode ficar rico com essa máquina, eu acabei de ir ao banco e depositei todo o movimento de sábado e essa nota foi aceita normalmente no depósito.
Com um sorriso amarelo, Tito perguntou qual agência bancária ele havia efetuado o depósito, e essa era bem próximo dali, mas não ajudava muito, o que ele poderia dizer ao caixa do banco?
Voltou para casa aturdido e pensando, agora ninguém mais poderia associá-lo a nada. Só mais tarde, através dos noticiários das rádios e TVs ficou sabendo da cédula e de sua trajetória.
O caixa que recebeu a nota do bicheiro era novato, aquele era o seu primeiro dia de trabalho como caixa da agência bancária. Sem pratica para reconhecer detalhes de dinheiro falso, a única coisa que chamou sua atenção durante a contagem do dinheiro foi o fato da nota estar rabiscada com números escritos.
Ele dirigiu-se ao gerente para pedir orientação de procedimento. Este estava ao telefone e com assuntos importantes, rapidamente disse ao caixa:
_ Tome aqui R$ 5,00, depois eu vejo isso.
O caixa deixou a cédula rabiscada em cima de malotes do banco, e o gerente sem notar enfiou o dinheiro dentro de um desses malotes.
Ao término de sua longa conversa ao telefone, o gerente guarda alguns documentos justamente no que estava a nota e encaminha-o para o Presidente do Banco D’IJAU, que já aguardava esse relatório.
Ninguém notou o dinheiro preso no fundo do malote e, este ficou ali até o dia seguinte.
O uso de malotes para encaminhamento de correspondências é uma pratica rotineira e dessa forma, sem perceber nada diferente, o Presidente do Banco faz chegar alguns outros relatórios aos Diretores de sua agencia em Brasília. Descuidados também, lá, ninguém nada notou de diferente, apenas retiraram os documentos enviados.
Para enviar algumas informações ao Presidente do Banco Central, usou esse malote e o enviou e este para o Presidente do Congresso Nacional, com convites para a inauguração de outra agencia naquela cidade. Mas desta vez, a nota foi encontrada grudada aos convites e ela gera muitas dúvidas ao Congressista que se perguntava: _ O que será que meu amigo quer me dizer com esses números anotados nessa cédula, o que quer dizer-me com o numero 96-97 anotados nessa nota?
Deve ser algo tão confidencial que ele preferiu não me falar por telefone com receio deste estar grampeado. Deve ser algo muito sério, e, passou o dia inteiro com aqueles números na cabeça.
Ao anoitecer daquela sexta feira, quando todos costumam se reunir em casa para tomar uns drinques, ele resolveu ligar para o Presidente do Banco Central.
Inicia dizendo:_ Amigo, vou lhe dizer dois números, e você me dirá o que lhe vier à cabeça são eles 96 e 97.
Imaginando tratar-se de uma brincadeira, este responde:_ Caro amigo, 96 e 97, são uma vaca e um veado juntos, e isso é bem perigoso, desligando às gargalhadas.
O presidente do congresso associou imediatamente, vaca, era como chamavam a líder da oposição e veado o da situação, e se eles estão juntos, há algo de errado nisso. Atento aos movimentos de ambos, e, por sorte, descobre que eles tramavam sim, derrubá-lo do cargo. Sabedor disso cuida-se evitando definitivamente sua deposição, e comenta:_ que sorte me deu esses R$ 5,00 com números escritos.
O tempo passa e a nota falsa fica esquecida na mesa do congressista.
Um dia, de passagem para o plenário, ele pede para um auxiliar comprar o jornal e que ele pegasse dinheiro na gaveta de sua mesa. O auxiliar encontra a cédula falsa e segue para o jornaleiro. Este era ex-funcionário do congresso, e nutria ódio mortal ao Presidente, que o demitira após descobrir suas tramoias e trapaças enquanto funcionário dele.
Ao receber o pagamento, notou de imediato a falsificação, mas nada comentou. Ligou para a policia e denunciou o portador do dinheiro, o objetivo era atingir seu desafeto e finalmente vingar-se de sua exoneração, pois certamente o auxiliar contaria a origem daquela nota.
“A imprensa sensacionalista destaca nas manchetes PRESIDENTE DO CONGRESSO USA AUXILIAR PARA ESPALHAR DINHEIRO FALSO”
Tito, agora sabia onde havia ido parar seus R$ 5,00.
Apavorado, conversa com o cunhado, este se prontifica solucionar o problema.
Vai até Brasília e pede uma entrevista coletiva com a imprensa para falar sobre a nota falsa. Conta toda sua história, destacando na entrevista o nome da máquina copiadora que estava sendo lançada.
Durante mais de uma semana o assunto foi tema dos noticiários nas rádios e TVs, mas, finalmente a policia arquiva o caso, ficou evidente que não se tratava de derrame de notas falsas.
A imprensa reconstitui o trajeto da nota descrito pelo cunhado de Tito e toda história acaba confirmada.
Dias depois, Tito é procurado pelos fabricantes da máquina copiadora e compra o direito de usar essa história como propaganda, e a chamada no comercial é “NOSSA COPIADORA É UMA FÁBRICA DE DINHEIRO”.
Com essa venda, Tito compra o carro ano 96 modelos 97 para seu cunhado, O pai de Tito escreve a história dos R$ 5,00, e com ela concorre e ganha um concurso literário. “O menino que deu origem a essa aventura ganha caixas de “jujubas” de presente, e Tito pode enfim tirar a sua soneca”.
FIM
Tito Cancian – italianodeoderzo@hotmail.com