O tempo e as intempéries
Ao arrepio do natural da lei das intempéries,
queremos nós burlar o tempo a todo instante.
De que jeito?
De todas as maneiras que,
manhosamente, o finório nos permite:
tangendo as rugas para debaixo da pele;
cobrindo as indeléveis marcas com pó de arroz;
burlando as cicatrizes com arrebiques
ou se fazendo de sonso-leso no passar dos anos...,
e coisas muito mais pior: nem vale a pena dizer.
E no carcomido do corpo e da pedantice leviana,
vamos levando a dolentes passos de valsa
os fáticos borbotões de crueza do reimoso do tempo:
faceirice sem nexo, vendo pela angulação do recalque.
Mas pra que tanta cisma com as trapaças do tempo,
se não tem justeza essa ferruginosa ruinaria?
Podia ser mais condescendente, o briosíssimo tempo;
mais complacente e criterioso no seu lerdoso passar.
Então, se não tem nada que o faça estancar,
Temos mais é que tentar burlar e tapear e enganar...,
tangendo as rugas para debaixo da pele;
cobrindo as indeléveis marcas com pó de arroz;
burlando as cicatrizes com arrebiques
ou se fazendo de sonso-leso...,
e falsear o que se pode falsear:
isso para não esmorecer e destrambelhar de vez;
isso para não se apoquentar e enxovalhar o tempo;
isso para fingir que o tempo não nos encalça
e que não é, a existência, ruinosa e perversa!
Manhas de um falsear que condiz com a nossa essência!