A CIGARRA II (Cordelzinho)
A Formiga
Disse a formiga à cigarra:
Tanto canto, tanta farra
Sei que muito irás tiritar
Quando o inverno chegar.
A Cigarra
Não sei se entendi tua fala
Mas tenho aqui nesta mala
Instrumentos que alegria dão
Nestes dias quentes de verão.
A Formiga
É a mais pura verdade
No inverno sinto saudade
Do teu canto maravilhoso
E penso no tempo precioso
Perdido somente a cantar
E sem um minuto trabalhar
Para prover a tua casinha
De comida e uma roupinha
Que alimente e aqueça,
Teu o corpo frágil, não esqueça.
Cantar é muito bom, é lindo,
Com fome é a vida escapulindo.
A Cigarra
Será que perdestes o juízo?
Ou seria um enorme prejuízo
Se das tuas folhas um maço,
Tu jogasses em meu regaço?
A Formiga
Não me venhas com essa falação
Tens boa voz e um corpo são.
Podes cantar durante o dia
A noite terás trabalho de vigia
Da minha rica despensa de folhas,
Todas fruto de minha escolha.
Teu pagamento será um décimo
Com direito a um acréscimo
Se o trabalho for bem feito.
A Cigarra
A proposta é sem fundamento
Não dormir é um argumento
Para tal trabalho eu rejeitar
E de tal pessoa me afastar.
Como posso o mundo alegrar
Com minha voz, o meu cantar
Se preciso a noite trabalhar.
A Formiga
Então minha nobre e bela cigarra
Vá cantar e fazer sua algazarra
Bem longe, no fim do mundo
Pois eu considero um absurdo
Querer comer sem se esforçar.
Das minhas folhas nada terás
E quando o inverno chegar
E sentires a fome te apertar
Canta muito até ela passar.
27/10/2023
(Maria Hilda de J. Alão)