Efuturo: Foro íntimo (5º ato)

Foro íntimo (5º ato)

Quem sou eu?
Fiz essa pergunta, hoje,
pela enésima vez,
perante o espelho.
Pensa que tive resposta?
Qual o que!
Nenhuma!
Apenas o eco da minha interjeição,
ecoou pelo oco do mundo.
Fantasmático!
Tão somente incitou a minha demência.
Mais uma vez, esse disgramado,
não deu a resposta, por mim, esperada.
Oh! raiva do cabrunco.
Até tive vontade de furar os olhos,
desse peste, com ponta de tesoura!
Aaaaai! Que ÓDIO!

Até já devia estar acostumado.
Isso se repete “desde todo sempre”.
Mas sou renitente.
Aporrinhado que nem a gota,
fico me infernizando.
Inflamando minha ego-cen-tri—ci-dade.

Assim, vencido por minha egolatria,
temporariamente, claro,
resolvi dar um basta nesse lenga-lenga.
Decidi não mais arguir o espelho.
E olha que o espelho é fiel.
Me mostra como sou!...
De forma crua e impiedosa,
me despe de pudores e
me atordoa com lampejos de verdades.
A verdade nua e crua...
Dói, dói muito, muito mesmo.
Mas, sendo mero reflexo, posso crer,
não me deixa ambiguidade.
E há nada, além disso,
que não seja dúvida e medo.
Sim!...
Dúvida e medo.
Porque não?!

Mas não é isso que quero, no momento, altercar.
Não é a única posição que consigo conjurar.
Rezingar não vai, em nada, clarificar.
A cor com a qual está pintada minha
exterioridade, é ardilosa.
É insatisfatória e nem ao mesmo razoável!
Meu imaginário extrapola.
Me excede... Coaduna... Transborda!
E olha que eu ainda estou ponderando.

Pudesse eu, sempre arrazoar em mim mesmo,
tal como era ajuizado um rei.
Supremo!
Divino!
Detentor de todas as verdades...
Tangenciado pela razoabilidade.
Falsa!
Não resta dúvida.
Mas, soberaníssima,
quando vista pelos olhos da vassalagem.

E as mil bestas que em mim habitam,
seus ardis vil e suas estratégias tolas,
estão longe de serem dóceis.
Não me podem persuadir, óbvio,
não tem argumentos!
Mas, também, em gesto vingativo
não contribuem em nada.
Ficam lá, interiorizadas,
emudecidas tal qual meu espelho.

Me resta buscar auxílio fora de mim.
Motivo que me leva a exteriorizar meus anseios.
Quem sabe?!
Alguém, sensato e sincero...
- amigo não serve, há suspeição –
Pudesse esculpir minhas feições e,
possivelmente, dizer quem eu sou!
Inimigo?!
Muito menos convém.
Não é crível!
Há de dizer, só pra me sacanear:
“tão forte por fora, tão confuso por dentro”.
Isso já sei, mas o tom de sarcasmo
me será de uma implacabilidade sem conta.
Sei que não sou inelutável.
Prefiro não abarbar essas pelejas.

Seria um bom motivo
tirar proveito da tecnologia.
Podia lançar, nas redes sociais...
Tal apelo, seria impactante.
Mas, o que apareceria de aduladores!
Vão estar preocupados em mensurar minhas futilidades.
E uma avaliação das minhas amenidades,
em nada vai me esclarecer a suspeição.
Já basta eu, me narcisando.
Já é mais do que suficiente
a insurgência do meu interior.
A efervescência da meu egotismo.
Não preciso de mais bajulação que a minha própria.
Quero mesmo é saber!
QUEM SOU EU!?

Se Deus quisesse, fazia isso miraculosamente.
Mas parece até que tá judiando de mim!
Me perdoe!
Não quero fazer mal juízo.
Mas está me deixando muito confuso.
“Me jogou no mundo” sem muita explicitação!
O Senhor há de convir que
faltou a etiqueta de identificação.
Concorda?!
Isso não faz parte do “pacote”?
Podia ser, eu, uma exceção.

Ei! Leso...
“Que Rei sou eu”!
Qual é!?
Rei de porra nenhuma!
Não esculhambe.
Meu questionamento e claro.
Eu aqui abespinhado e você fazendo pilhéria.
Mais respeito com minha doideira!
Não afronte minha excentricidade.
Não sou Rei e
não pretendo, tão pouco,
me candidatar a bobo da corte!
Isso não está no meus planos.

Assim... Arrostado,
resistindo à empáfia do meu ego...
Dá até vontade de sair,
pra fazer compras no shopping.
Coisa pouca.
Mas, nas lojas, sempre as atendentes,
(VENDEDORAS...)
fazem elogios.
Também, querem vender suas porras!
Não publicitariam de maneira oposta.
Mesmo sabedor que a lisonja e
as vezes mentirosa, é bom ouvir!
“O Senhor fica muito bem nesta roupa”!
As vezes está uma porcaria.
Mas, cinicamente, gosto e sempre respondo.
Verdade?!
Eu também gostei!
E parto para outra prova,
buscando mais um galanteio.
Puta-que-pariu!
O que preciso fazer pra alimentar minha egolatria.
E ainda por cima é caro.
Mais caro ainda quando entra a porra do ICMS.

Esse e um motivo,
entre outros infindos,
que tangenciam,
pra que eu deixe tudo como está.
Eu e o meu espelho mudo-quieto,
afirmando aquilo que sei de “cor e salteado”.
E claro!
É muito mais fácil arrostar e
increpar uma imagem refletida.
Tem suas vantagens!
A ausência de palavras,
explicita muito mais que qualquer arenga.
Nunca diz nada mais do que aquilo que já sei.
Não é o quero ouvir, pois,
em verdade, nada escuto do espelho.
Mudo e quedo que nem “dois de paus”!

E isso é inquietante.
É duro servir a uma vontade que não endosso.
Queira ou não,
estou sempre tangenciando meu egoísmo.
Espraiando minha necessidade óbvia
de satisfação pessoal,
afetada pela minha insensatez,
com um acometimento de anseios,
emoções, sentimentos, aspirações,
cobiças, pretensões...
E por ai vai!
O espelho?
É apenas uma das minhas
inúmera maneiras de fugir de mim mesmo.

Vou me “fechar em copas”!
Você parece querer saber de mim,
mais do que eu mesmo.
Como não?
Fez perguntas,
também, ao meu espelho.
Desse nada vai conseguir tirar.
Só a mim ele dá respostas.
E tenho a mesma... Sempre!
De forma cruel e impiedosa.
Despida de modéstias e atordoante.
Se não auxilia, ao menos não atrapalha.
De certa forma, alimenta meu egocentrismo.
Mas, pra você?
Nada!
Absolutamente coisa nenhuma.
Sei disso porque já arrisquei xeretar
sua vida através do seu espelho.
Não foi possível nem mesmo saber
a cor do seu batom preferido.
E tenho certeza que não é
aquela que usou para mim!

Isso te assusta?
Eu querer saber de você?
Imaginar que me esconde algo?
Buscar sua intimidade é delito?
É motivo para fugir de mim?
Meu afligimento,
não pense que seja desatino.
É por conta da minha necessidade
de ser, o que nem mesmo sei...

E não me espere perfeito.
Sou perfeccionista.
Isso é certo!
De certeza tamanha, que quase não dou conta.
Me pego, em certos momentos,
aperfeiçoando sempre.
Não o imperfeito.
A este não dou polimento.
Mas aquilo que já tem esmero,
requinte, caimento,
grande inclinação amorosa!
Aquilo que está completado.
Apenas precisando de novas cores.

Vai me deixar continuar?
Fazendo beicinhos assim, me adoça.
Perco até a razão!
Fico sem juízo algum e faço sandices.
Isso não tipifica esse
anseio inglório que está inventando.
Esse amor que acha que estou sentindo.
Como sei o que está pensando?!
Você é transparente como cristal.
E nada escapa da minha argúcia.

Mas vamos lá!
E depois que a tinta secar?
Depois que degustar essa ansiedade?
Depois que findar meu “império de crepom”?
Depois de vencer minha egolatria?
Depois de discernir meu eu?
Depois do agora...
“E agora José”?

Aos néscios?
Vou devotar minha raiva e meu desprezo!