O DIA DEPOIS DE ONTEM - Crônica escrita em 2016
Mesmo que a frase dita por Galvão Bueno no encerramento da transmissão ao vivo do velório na Arena Condá fosse causada pela emoção, ela não deixa de ser um tanto idiota. Galvão disse que: “Seremos diferentes, seremos melhores, a partir de agora”. Infelizmente não seremos diferentes. Muito menos melhores.
Sempre gosto de dizer que a indignação é um sentimento com curto prazo de validade. O mesmo podemos dizer da comoção. Não sei se está no DNA dos brasileiros. Nossas tragédias caem no esquecimento numa velocidade espantosa.
Achamos erradamente que as vítimas das tragédias sãos as que falecem. As verdadeiras vítimas são aquelas que ficam. Ninguém mais além delas, poderão sentir e saber como serão os dias depois de ontem. Para nós de longe, é fácil blasfemar que a vida “segue”.
É lógico que a vida segue. Ela sempre tem de seguir. Só que tudo muda quando, de repente, uma estrada acaba, e temos de tomar um atalho totalmente desconhecido. Sem saber o que existe na próxima curva. Então olhamos, e ao nosso lado já não está quem poderia ajudar no passo seguinte.
Até no sábado que passou, o Brasil viu muitas lágrimas. As lágrimas que o Brasil deveria ver começam a rolar no dia depois de ontem. Quem fará questão de olhar? Quem fez questão de olhar depois da tragédia da Boate Kiss? Da tragédia de Mariana. Podemos ainda incluir a tragédia do Furacão Catarina.
Os primeiros a darem exemplos de que não seremos diferentes, e nem melhores após a tragédia de Chapecó foram os nossos políticos. Enquanto os mortos eram contados na Colômbia, a Câmara de Deputados com quórum suficiente, atravessava a madrugada aprovando leis, com as quais os corruptos poderão se fingir de vítimas.
O presidente do Senado Federal, e agora réu Renan Calheiros, quis aproveitar o script escrito pelos deputados. No mesmo dia, um dirigente do Internacional, chamou a possível queda do time para a Série B de tragédia. Se estivéssemos em outro país, a frase de Galvão Bueno poderia fazer algum sentido. Não no Brasil.
Ainda sobra para o presidente Michel Temer. Já tivemos um presidente que nunca sabia de nada. Agora temos um que nunca sabe se vai ou não vai. É inacreditável que em pleno luto nacional, um presidente não tenha a coragem de abrir a boca. Sua expressão facial e corporal, após muitas horas de pé era de: “Por que eu vim?”
Parte da frase do Galvão Bueno cabe, entretanto, para as vítimas. Suas vidas que “segue” serão obrigatoriamente diferentes. E tomara que as promessas não sejam esquecidas. Temo que elas serão! É inacreditável também, a grande preocupação com um time de futebol. Desde o dia depois de ontem, a menor de todas as vítimas.