Efuturo: O Outro Lado do Espelho/ Coleção Contos

O Outro Lado do Espelho/ Coleção Contos

A noite estava escura, como sempre ela dormia com uma pequena luz azul no corredor da casa. Para clarear parte do quarto. Seus livros de magia ficavam à frente numa escrivaninha de madeira, junto com seu diário mágico. Uma lição de seu mestre deixava-a preocupada. Queria estar pronta e determinar quando seria seu ponto de partida. Entre um lado e outro.
Dias atrás teve um sonho estranho sobre aquele espelho e resolveu que ia investigar. Olhando de frente nada compreendia, porque na verdade Jasmine não estava pronta. Pelo menos foi o que seu mestre tinha lhe falado alguns dias.
Aquele dia lera bastante e já não aguentava mais. O cansaço físico e mental pusera num sono terrível e seu corpo parecia que pesava mais que o normal. Dormiu entre os livros. Exausta.
Nem viu exatamente que horas permanecia lendo e que tinha adormecido.
Ela estava de frente para o espelho do corredor e via sua imagem entre a luz azul. A imagem mostrava apenas seu rosto. Mas, aproximou e viu que nos seus olhos não havia nada, a não serem dois espaços vazios. A imagem se movia sem que ela se mexesse.
Um som abafado de seus lábios disse alguma coisa, mas foi impossível compreender. A imagem do outro lado passou a mão direita com o indicador sobre os olhos e terminando pela boca. Desenhando um triangulo invertido.
Algo se movia atrás dela. E era à sombra de uma criança. Jasmine se virou e viu que estava dentro do espelho olhando o corredor da casa de frente.
O espelho se movia e ela também queria se mover.
Ela olhou para todas as direções e via uma noite escura. Nada permanecia naquele mundo, somente ela.
Jasmine começou temer e gritar, mas o som de sua voz não saía. Tudo que ela tinha que fazer era respirar fundo e se controlar.
Mais calma depois de alguns segundos via alguma coisa se mover lentamente, se arrastando ao seu encontro. Conforme a sombra aproximava, ela se recuava. Se afastando da moldura do espelho.
E sentiu uma forte queda. Caía sem parar num abismo que parecia não ter fim.
Quando sentiu suas costas bater no chão tinha chegado onde seu mestre queria que ela estivesse.
— Demorou.
— Como?
Olhando confusa pra trás viu um homem gordo e barbudo, alto e olhava-a fixo. E ela devolvia aquele olhar porque estava muito mais confusa.
— Como eu vim parar aqui? – E você é o mestre do livro de magia?
— Sim. Eu sou o mestre e você veio aqui porque eu chamei.
— Como?
— Trabalho por meio de sonhos quando sei que um discípulo não está pronto devidamente.
— Como assim devidamente?
— A observar outro mundo na qual envolve coisas que a mente humana não compreenderia. Nos sonhos seria mais fácil de demonstrar uma pequena parte do que esse universo é capaz.
— E o que é esse lugar? – O que faz aqui?
— Muitas perguntas. Primeiro esse lugar seria o mesmo que o mundo das sombras, o seu eu lutando contra alguma coisa em seu mundo exterior. Segundo, eu só estou aqui em seu sonho. Não estou aqui de verdade. Se é que me entende.
— O senhor me diz que está aqui porque eu quero?
— Sim. A nossa mente é uma passagem direta com os seres que já se foram.
— Pode explicar melhor?
— Sim. A mente humana cria coisas. Quando se deseja você visualiza e consequentemente cria. Por meios de realizar o que se imaginou. A imaginação nada mais é que um pensamento vivo com imagens. Todos têm poder, mas não a usa. Talvez, por medo ou falta mesmo de conhecimento. Em sua mente você sondava o espelho e fixou aquilo em sua subconsciência como se ele fosse um portal. Realmente, os espelhos são portais, mas moderadamente em seu mundo físico, como o andar de cima. O que transmite a beleza e a vaidade. O que quer que veja é a forma como o mundo a vê. E nada muda.
— Então isto na verdade é só um sonho?
— Exato. Mas, você conseguiu desvendar o que há por trás dele. O portal ou o espelho carrega lendas de que os segredos se escondem neles. E que você pode voltar no tempo, como pode avançar. Eu não recomendo isso.
— Por que não?
— Porque é muito perigoso, ainda mais se não estiver pronta. Atravessar um portal é se expor a ele. Não é como uma adivinhação como os chás ou o café no fundo do copo. É sentir o fundamento de uma época, sentir a temperatura dos climas, ser visto por alguém como eu a vejo.
— Então o dogma desta verdade é uma mentira?
— Não. Nunca foi uma mentira. Tanto que grandes cientistas e profetas da época foram vítimas de hereges e muitos morreram. Suas vidas foram mais curtas que o parecer dos outros. Um pé nesse mundo é um tempo significativo no seu. E muitas descobertas sobre o passado ou o futuro podem carregar coisas ou leva-las.
— Eu vou me lembrar.
— Isto serviu de lição?
— Sim.
— Então é hora de partir para seu mundo, mas lembre-se que o canal fora aberto e nunca mais poderá fechar. Exceto de uma forma.
— Qual?
— Deixar definitivamente o mundo da magia.
— Isto nunca.
— Então você já é uma discípula. Eu sempre serei seus olhos. Bem vinda ao seu novo mundo.
Jasmine acordou com sua gata brincando e miando. Ela estava de volta.
Dormiu por muitas horas. Realmente se lembrou de cada palavra e percebeu que fora apenas por uns minutos conversando. Seu mundo realmente era outro e passava muito depressa.
A sombra daquele mundo silencioso permaneceu por noites em sua memória. E prometera pra si mesma que um dia ia voltar. Não importaria quanto tempo se passaria em seu mundo físico. Tudo que ela desejava era conseguir ver o rosto dele novamente, e desta vez, poder tocar.
Naquela viagem do outro lado do espelho conseguiu dar um passo adiante no mundo mágico e tinha certeza de que tudo que vira em seu sonho e as conversas com seu mestre não fora em vão.
A vida não é tão abstrata. E não tão sólida. Pelo menos não o mundo de Jasmine que via e compreendia fatos incompreensíveis para o plano físico.
A magia era seu mundo. E tudo podia ser capaz.
O outro lado do espelho tinha uma imagem, mas não era dela.
Era outro universo.
O seu em transformação.