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MUITO ALÉM DE MIM MESMO

Não fazia o menor sentido. Tudo o que eu sentia era uma extrema confusão como se tentasse, inutilmente, formar palavras em uma sopa de letrinhas. Fazia poucos minutos que minha visão começara a ficar turva e confusa.
À minha volta, movimentos de vultos indefinidos compunham um balé sem música. Distinguia apenas contornos, como se uma redoma de algum material opaco me aprisionasse. Uma prisão sem grades, onde eu mesmo era meu carcereiro e meu caminho de fuga.
Mas era dentro de mim onde a maior guerra era travada. Os monstros que eu sepultara há tanto tempo que nem podia me lembrar, procriavam, multiplicando-se em correntes de pesadelos. Dentro de mim, um mundo hostil tomava forma.
Quando tentei levantar, percebi que o torpor atingira minhas pernas — ou melhor, havia transformado meu sistema nervoso em um quebra-cabeça que não se encaixava. Não conseguia me mover.
O grito que pensei ter dado não conseguiu chegar ao mundo exterior. Apenas provocou a ira dos monstros que cresciam em número e ferocidade dentro de mim. Nasceram desertos intransponíveis e ruas envoltas em neblinas, cenários para os crimes que pretendia cometer contra mim mesmo.


Mais alguns minutos, senti que vários horizontes e dimensões desconhecidos estavam sendo cruzados. Eu viajava, enquanto a corrente sangüínea se tornava um rio de lava, ou vários, percorrendo o meu organismo.
Experimentava sensações como quem prova sabores exóticos. Imagens de velhos poemas, que li na infância, fundiam-se aos sons de vozes desconhecidas recitando.
Em seguida, senti que me desprendia do meu corro e que já não havia limites. Não havia fronteiras. A redoma nebulosa que me envolvia, naquele momento, abrangia pedaços maiores do mundo. Pude entrar na mente de alguém que passava e vasculhá-la, sem pudores. O desconhecido nem sentiu que eu o devassava, mas eu senti o poder - o infinito poder da onipresença, a marca da divindade.
Não havia mais sentido para sonhos ...
Todo absurdo, por mais louco que fosse, era possível — era real.


Em duas horas, já me considerava eterno. Um fio tênue, prateado talvez, ainda me atava ao corpo — aquele pedaço de carne inerte, que me aprisionara por tantos anos, 35, se não me engano
Não, definitivamente não! Deuses não se enganam. Foram 35 anos naquela casca, dando valor a ela, lutando para permanecer vivo e são para estar a salvo de doenças, de vícios, de ladrões, da fome, da guerra e dos meus demônios mais íntimos ...
Que sentido tinha tudo aquilo?
Que razão havia na Razão, quando a mente tinha funções ainda mais nobres e valiosas?
Eu viajava...
Na dimensão em que me encontrava eu podia fazer tudo o que quisesse. Mas ainda tinha aquele vago fio prateado me ligando às minhas prisões de antes. Mesmo assim, arrisquei urna viagem muito mais ousada.
Em instantes, fundi-me a um computador, dos vários que se encontravam na sala em que meu corpo inerte jazia. De que valia explorar mentes humanas, tão presas aos seus limites, quando um cérebro eletrônico, vivo e onisciente, já não me era inexpugnável?
A fração de tempo que se seguiu foi suficiente para que eu percorresse cada recanto daquele computador e dominasse cada uma de suas funções. Ele mesmo, com seus inúmeros enlaces de componentes eletrônicos, era apenas mais uma conquista — fácil demais.


Percebi que era pouco. Nada me prendia aquele planeta imundo, de cidades poluídas, gente carrancuda e líderes demagogos decidindo destinos. Não havia longe ou perto, não havia limite para aquele poder.
Parti, então, para visitar planetas distantes. Mais do que isto , pude tocar o Sol, tornar-me um manto sobre ele e sugar sua energia, me alimentar dele. Tudo isso em instantes, frações eternas do tempo.
Passei por Mercúrio e seu movimento apressado — que já não me parecia tão enigmático. Se ele era o Deus da velocidade, eu podia ir mais rápido. Vênus, novamente a Terra, Marte e uma penca de asteróides ... Todos um a um, prestando reverência a mim. E depois Júpiter, que me parecia pequeno.
Quantas vezes ouvi falarem sobre a gravidade absurda daquele planeta. Mas ele nada podia sobre mim. Mais adiante, Saturno e seus anéis me esperavam. Poderia colocá-los — os anéis — em meus dedos. Acho que um Deus faria isso...
- Tenho o poder absoluto! — pensava eu naquela microfração de segundo que levei para sair do sistema solar e chegar a Veja ... Então era a você, “estrelinha”, que meu Sol devia reverência. Pois transforme -se em uma anã, uma anã branca. Venha para as minhas mãos, “estrelinha”! Poderia transformá-la em pó, se quisesse, mas serei benevolente.
O poder sem limites era glorioso, mas ainda assim cansativo. Precisava mais. Podia ser mais do que Deus... No entanto, o fio prateado ainda teimava em prender-me àquela casca, inerte, entorpecida — confortavelmente entorpecida em uma cama rodeada por meia dúzia de cientistas que se achavam deuses.
Mas nada me impedia de cortá-lo, de romper de uma vez por todas qualquer laço. Afinal, nem três horas haviam se passado e eu já estava nos limites da Galáxia.
— É, corpo ... já não preciso do você!


— Sinais vitais enfraquecendo, doutor.
— Nós o estamos perdendo. Vamos tentar a desfibrilação novamente Atenção! Cinco, quatro, três, dois ... Agora!
— Negativo. Não responde mais aos estímulos. Batimentos zero.
— Perdemos a pressão! Desfibrilar mais uma vez!
— Não adianta, Kriller. Ele não resistiu. Cheguei a pensar que seria diferente...
— Até agora ninguém tinha resistido por três horas à Droga de Ampliação da Mente.
— Sinceramente, Kriller, a DAM talvez seja muito forte. Não sei se o ser humano está preparado para usar 100% de seu potencial mental ...
— Talvez não, Richard. Talvez não ...


Pouco mais de pequenos átimos, eu me expandia, como um coração em constante diástole.
Havia me fundido ao Universo.
Mas eu sabia que podia mais, muito mais...



(Direitos reservados. Parte do livro de contos de ficção científica "Viajante Noturno", de William Mendonça, disponível para download gratuito em www.williammendonca.com)

 
   
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